Caros,
Ao logo do tempo, nestas Notas, temos buscado entender aspectos de alguns grandes empreendimentos, e de empreendedores e gestores notáveis. O Brasil Holandês foi um empreendimento grande e Maurício de Nassau um grande CEO.
Vimos, em várias Notas no começo deste ano de 2022, que a Holanda, como país, nunca invadiu o Brasil. Quem invadiu foi uma empresa da Holanda, a WIC – West-Indische Compagnie, Companhia das Índias Ocidentais. A WIC calculou o custo da empreitada, quantos soldados teria que contratar, os navios que tinha de usar, e as receitas que adviriam da cana de açúcar e do apresamento de navios portugueses, ou seja, da pirataria a partir da costa brasileira. A pirataria às vezes dava retorno mais rápido e era mais rendosa do que o açúcar.
Seis anos após a invasão e tomada de Recife e Olinda, a WIC contratou, em 1636, Maurício de Nassau como governador, o CEO do empreendimento, para comandar a Administração, as Finanças e as Forças Militares de mar e de terra da Companhia. O job description de Nassau certamente exigia perspicácia e autoridade. Perspicácia – de que dera provas antes de vir para o Brasil, e autoridade – pela nobreza de sua estirpe.
O capitalismo holandês era assim: Vimos, em várias Notas no começo deste ano, que a Holanda, como país, nunca invadiu o Brasil. Quem invadiu foi uma empresa da Holanda, a WIC – West-Indische Compagnie, Companhia das Índias Ocidentais. A WIC calculou o custo da empreitada, quantos soldados teria que contratar, os navios que tinha de usar, e as receitas que adviriam da cana de açúcar e do apresamento de navios portugueses, ou seja, da pirataria a partir da costa brasileira.
Rapidamente, os neerlandeses tomaram Recife e Olinda, na costa, mas levou bastante tempo para a conquista do interior. A guerra foi deroz e mortífera e a guerrilha tenaz e destrutiva.
Seis anos após a invasão, a WIC contratou, em 1636, Maurício de Nassau como governador, o CEO do empreendimento, para comandar a Administração, as Finanças e as Forças de Mar e de Terra da Companhia. Quando, finalmente, Nassau pôde respirar, tendo assegurado o domínio holandês numa larga extensão do Nordeste brasileiro, tinha que gerar receita, e valor para o acionista.
Mauricio de Nassau e os engenhos: A tarefa realmente prioritária era a reativação da produção açucareira. Dos 150 engenhos existentes no Brasil holandês, a quase totalidade achava-se destruída pela guerra de guerrilha, seja completa, seja parcialmente, nos seus canaviais, no equipamento fabril e na mão de obra africana. Ademais, quase a metade desses engenhos havia sido abandonada pelos proprietários, que conheciam o negócio em sua totalidade; eles emigraram para a Bahia, para o Rio de Janeiro mesmo para o Reino. No total, umas 15 mil pessoas – isso era muita gente – haviam ido embora, das quais um terço eram escravos. Muitas fazendas estavam desertas. Que fazer? É aí que entra a perspicácia e a autoridade de Nassau. Perspicácia – de que dera provas antes de vir para o Brasil, e autoridade – pela sua estirpe nobre, ainda que só se tornaria conde 30 anos depois que voltou para os Países Baixos.
Nassau logo entendeu que só a classe média rural luso-brasileira conseguiria repor em funcionamento a indústria açucareira. Era necessário, pois, atraí-los para a produção, garantindo-lhes direitos, mesmo diante da cara feia da WIC – Companhia das Índias Ocidentais. Sem os lavradores de cana, os mestres-de-açúcar, os feitores, os artesãos e os lavradores de víveres, nada feito. Os neerlandeses não dominavam as técnicas de produção e gestão: “nós governamos a terra e os colonos, mas os portugueses governam os nossos meios de produção”, reconheceu uma autoridade da época.
As medidas para reativar a economia: Nassau incentivou o retorno dos emigrados com a promessa de liberdade de consciência, gozo dos bens e igualdade de direitos com os neerlandeses, mas, neste último caso, teve dificuldades de cumprir.
De todo modo, começou a surgiu um ânimo novo na região. Em 1637-8, Nassau mandou leiloar os engenhos confiscados aos proprietários que emigraram, a maioria no sul de Pernambuco, ondeais de 2/3 dos engenhos foram revendidos. Os compradores eram judeus, neerlandeses (inclusive, funcionários e militares da Companhia), e luso-brasileiros. Nos anos seguintes, estes recompraram muitos daqueles.
O caso de João Fernandes Vieira, um dos futuros heróis da guerra de libertação contra os holandeses, é bem interessante. Ele era um mero feitor de um proprietário batavo, mas comprou os engenhos do patrão que, desapontado com a experiência, lhe transferiu a dívida.
O preço médio de um engenho variou entre 30 e 40 mil florins, e o total das vendas atingiu 2 milhões de florins para os cofres da WIC.
O interesse do acionista e o curto prazo: Nassau concedeu um prazo de 6 anos mais 6 meses de carência para pagamento dos engenhos. A WIC achou demasiado. Nassau teve de lembrar que os compradores dos engenhos tinham de assumir custos e risco não desprezíveis: o custeio da safra, a limpeza e a plantação de novos canaviais, a compra de escravos, de animais de tração, e todo o equipamento de fabricação do açúcar. Isso custaria algo entre 60 e 80 mil florins. Além disso, como as plantações estivessem inteiramente destruídas pela guerra de guerrilha, em muitos casos, a primeira safra só poderia ser colhida depois de 3nos. De todo modo, dos 150 engenhos, quase 100 estavam em condições de moagem na safra de 1637-8, o que levaria a uma produção de quase 350 mil arrobas dos vários açúcares para exportação.
Nassau dizia: se não investirmos e dermos condições aos produtores, teremos pouco para exportação.
Aliás, para estimular o aumento da produção, Nassau queria que mais imigrantes dos Países Baixos viessem para o Brasil, trazendo seus capitais, e, com esse fim, era a favor do livre comércio, limitando os monopólios da própria Companhia das Índias Ocidentais, o que, claro, gerou desgosto no Conselho da WIC.
Escravos e Imigração de Colonos: A oferta de mão de obra africana abundante era essencial na visão de Nassau. Dizia ele “Sem tais escravos não é possível fazer coisa alguma no Brasil: os engenhos não podem moer, nem as terras ser cultivadas. … Se alguém se sentir incomodado por isso, será um escrúpulo inútil”.
Os holandeses, imaginando que a África era tudo uma coisa só, tomaram o forte de São Jorge da Mina, na África Ocidental, e deixou a Mina sob administração de Recife. Não deu certo. O escravo da Guiné não tinha a eficiência do escravo de Angola, lembra o grande historiador Evaldo Cabral de Mello, a grande referência neste assunto. Bem, os holandeses compensaram em parte o equívoco capturando navios negreiros portugueses…
Mas era necessário, achava Nassau, que colonos neerlandeses viessem para o Brasil. Não um qualquer, mas aquele com disponibilidade de investir. Ele queria também povoar o interior, para garantir, no longo prazo, a preeminência da WIC no Brasil.
Nassau admitia claramente que os colonos neerlandeses não poderiam substituir a mão de obra escrava, pois era muito penoso abater grandes matas, limpar e cultivar a terra; o trabalho pesado não agradava a maior parte dos holandeses do Brasil. “Não convém, pois, que se mande gente pobre”.