Notas & Comentários – 29-09-2023

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A Europa e seus monumentos: Em umas Notas de maio deste ano, tive saudades da Europa e escrevi sobre a Sainte Chapelle: o impacto visual grandioso de seus vitrais marca nossas vidas. Muitos amigos apreciaram especialmente essas Notas. Assim, vou, de vez em quando, seguir nesta senda e abordar outros monumentos históricos europeus: catedrais, monastérios, castelos, palácios… começando por Notre -Dame de Paris.

A Arte, na pintura, na escultura e na arquitetura, a arte agrada a inteligência, delicia os olhos, instiga a imaginação, alegra a vida.

O Milagre Medieval: Antes de discorrer sobre a Catedral de Notre-Dame de Paris, vou falar do conjunto das catedrais, igrejas e capelas francesas, lançando mão d o excepcional livro d e Jean Gimpel, Les Bâtisseurs de Cathédrales (Seuil, 1958).

Num período de 300 anos, de 1050 a 1350, milhões de toneladas de pedra foram talhadas para a construção de 80 catedrais, 500 grandes igrejas, e dezenas de milhares de igrejas paroquiais.

Mais pedra foi escavada na França durante esses três séculos do que em qualquer tempo no antigo Egito. Apesar de que só o volume da grande pirâmide é de 2.500.000m³.

As fundações das catedrais chegam a 10m de profundidade. É mais ou menos a profundidade média no metrô de Paris. Casos há nesses edifícios religiosos com tantas pedras no subsolo quanto acima da terra.

As Catedrais e as Pirâmides: Mas vale outra comparação entre catedrais francesas e pirâmides egípcias, no que respeita aos usos desses monumentos ao longo dos séculos.

Obviamente, a utilidade das pirâmides, hoje, é serem vistas. Não que sejam particularmente belas, mas, pela antiguidade e monumentalidade, desperta m a sensação do sublime. Como no conceito de Edmund Burke: o sublime que nos assombra e mete medo, mas que amamos.

As catedrais, não. As catedrais são mais do que sublimes, são belas, no sentido mais puro da beleza, como algo que agrada a vista, toca o coração e eleva a alma.

Depois de tantos séculos, lá estão as pirâmides, sem nenhuma utilidade além de serem vistas. As catedrais permanecem com os mesmos usos: são a casa de Deus. As pessoas continuam indo lá para a oração, para o recolhimento, por amor a Deus.

A Fé na Idade Média: A fé eleva. A fé constrói. Na Idade média havia uma igreja ou capela para cada 200 habitantes. De tal maneira que a área coberta pelas igrejas era muito grande com relação ao tamanho modesto das cidades medievais.

Em cidades como Norwich, Lincoln e York, com população entre 5 e 10.000 habitantes, havia respectivamente 50, 49 e 41 igrejas ou capelas. Clairmont, cidadezinha francesa que a colheu o Concílio de 1095, tinha mais de 50 igrejas.

Catedral de Amiens

O tamanho da estupenda Catedral de Amiens (ao lado) era de 7.700m² e permitia que toda a população da cidade – umas 10.000 pessoas – pudesse toda ela participar de uma cerimônia na catedral.

Se alguém, numa cidade medieval, quisesse reconstruir ou ampliar sua igreja, muitas vezes teria de demolir uma ou duas igrejas vizinhas, e construir casas para os que seriam desalojados.

O Vandalismo da Revolução: Se a Idade Média empreendeu esse tremendo esforço para construir, para glória de Deus, a Revolução Francesa se esmerou em destruir, porque os iluministas achavam que a Razão é que era deus, ou que eles mesmos eram deuses. Não é à-toa que nas catedrais francesas, inclusive em Notre -Dame de Paris, durante as fases do Terror e do Grande Terror da Revolução, celebrava-se o culto da Razão, a Missa tendo sido proibida.

A Revolução Francesa achou que, para destruir a Igreja, tinha de destruir primeiro seus edifícios, monumentos e símbolos. O período de maior vandalismo da história ocorreu no autodenominado Século das Luzes, numa aplicação inesperada dos ensinamentos dos filósofos do iluminismo. E o maior programa de assassinato de religiosos que o mundo jamais vira, também.

Assim, a Revolução Francesa confiscou, tomou todos os bens e propriedades da Igreja. Depois, leiloou, vendeu e promoveu a destruição dos edifícios religiosos. P. ex., a Abadia de Cluny, uma das grandes glórias da cristandade, foi leiloada e destruída; a abadia de Clairvaux, casa de São Bernardo, foi quase toda destruída e o resto transformado em prisão; a estupenda abadia do Monte Saint -Michel se tornou uma prisão; a flecha da Sainte Chapelle foi arrancada e
este santo lugar que abrigava a Coroa de Espinhos de Nosso Senhor virou armazém e arquivo; todas (todas!) as imagens da Catedral de Notre -Dame de Paris foram destruídas, marteladas ou arrancadas: todas as que hoje lá vemos são de um programa de restauração do séc. XIX.

Quando os vândalos, que eram cristãos, ainda que hereges, saquearam Roma, mil e seiscentos anos antes da Revolução Francesa, os vândalos foram até bastante respeitosos: pouparam as Basílicas de São Pedro e de São Paulo… Mas os vândalos não tinham ideologia, só raiva – e ganância.