Caros,
Entre os vários tipos de monopólio (ou oligopólio), há o que tem poder de dominar ou restringir o comércio, e o que tem poder para censurar, e estabelecer o que o cidadão pode ou não expressar e falar.
Diretamente, a Amazon faz parte desse primeiro grupo. Meta, Google e outras Plataformas, do segundo.
Esses dois tipos de monopólio podem degradar o homem. O segundo pode imensamente mais.
O primeiro pode causar, digamos, fome e ofende o estômago. O Segundo promove a ignorância, embota a inteligência e oblitera a mente.
A primeira vez que considerei o processo antitruste contra a Standard Oil de Rockefeller, achei exagerado. Afinal, o povo nunca pagara tão pouco pelo petróleo.
Quando Tim Wu publicou seu The Curse of Big Business, achei exagerada a apologia das ideias do ainda advogado Louis Brandeis, o futuro Juiz da Suprema Corte americana (1916). Afinal, qual o problema de uma pessoa de mérito ser extremamente rica?
Na verdade, Theodore Roosevelt tinha razão em investir contra a Standard Oil, apesar dos preços baixíssimos de seus produtos. O preço baixo não pode anestesiar. E Tim Wu tinha razão em recordar o pensamento de Brandeis em seu livro. E Brandeis tinha razão em sua preocupação com o poder da riqueza exagerada.
Brandeis disse uma verdade cada vez mais evidente nos dias da Era Digital: “Podemos ter democracia, ou podemos ter riqueza concentrada nas mãos de poucos, mas não podemos ter os dois”. Por isso a democracia está tão ferida hoje em dia.
E a Inteligência Artificial está só começando.
O Caráter dos Monopólios: Entre os vários tipos de monopólio, há:
- o que tem poder de restringir e dominar o comércio, e
- o que tem poder sobre o fluxo da informação, e, logo, de censura, estabelecendo o que o cidadão pode ou não expressar e falar.
Diretamente, a Amazon faz parte desse primeiro grupo. Meta, Google e outras Plataformas, do segundo.
Esses dois tipos de monopólio podem degradar o homem. O segundo pode imensamente mais.
O primeiro pode causar, digamos, fome e ofende o estômago. O Segundo promove a ignorância, condiciona comportamentos e oblitera a mente.
France, où es-tu?: No início, a gente pensaria: jamais a França vai aceitar uma coisa dessas, ser controlada por mídias estrangeiras. A França do inconformismo (ainda que por impulso), dos protestos (ainda que sem sentido), das revoluções (ainda que cruéis), a França não vai aceitar ser impedida de pensar, de exprimir o pensamento, de falar livremente, de duvidar, de filosofar? Ou vai? Foi. A barreira historicamente intransponível foi derrubada tranquilamente.
Essa passividade é uma revolução. France, où es-tu?
Eis que o monumento mais visitado da França é a Disneyland, que em 2022 contou com 15 milhões de visitantes, enquanto o Louvre – Le Louvre! – teve 7,8 milhões. Metade. De Notre-Dame até a Disneyland são mais de 40 min de carro na estrada; o Louvre está no coração de Paris, servido por metrô e tudo. France, où es-tu?
Quando a Roma, a cidade imperial, tinha um milhão de habitantes e uma multidão de pessoas sem ter muito o que fazer, foi-lhes dado o anestésico do Coliseu: o espetáculo era a crueldade. O patriciado sabia que, sem trigo, vai, mas sem distração, não vai. O mundo digital é um grande Coliseu. O domínio pela distração.
A vida digital: A descerebração do mundo veio envolta em coisas agradáveis. A superficialidade, os faits divers, a bisbilhotagem, a fofoca, a filosofia de botequim, o “você viu o que fulano disse?” – quem diria – dominam as conversações digitais. Todo mundo tem acesso ao pensamento, digo, às irrelevâncias, de todo mundo. Há uma competição para exibir, escancarar a privacidade.
O mundo digital prescinde de diálogo: cada um se dirige a um imenso desconhecido; o diálogo de narciso é um monólogo.
O excesso de diversão anestesia: Jogos, brincadeiras, distrações, coisas engraçadinhas, esses itens, em demasia, embrutecem a alma e embotam a inteligência. A reflexão vai-se, vai-se o trabalho intelectual, apaga-se o discernimento. A reflexão oblitera-se. Surge o hiato da razão, cujo vácuo é ocupado pelo nada.
No séc. IV, século dos grandes Doutores da Igreja, ainda lá estava o Coliseu. A partir de Constantino, já havia decisão de extinguir os jogos do Coliseu. Numa civilização que se cristianizava, era inadmissível homens, ainda que gladiadores, ainda que escravos, ainda que condenados, combaterem até à morte, para distrair espectadores. A lei era letra morta. O desejo do homem pela diversão é irreprimível, irrefreável, nunca completamente saciado, é uma ladeira abaixo: o homem afasta a razão naqueles momentos lúdicos, ainda que imorais. E assim é facilmente controlado, domesticado, dominado. Escravizado.
Tudo foi se alterando com o tempo: A primeira vez que li sobre o processo antitruste da Administração Theodore Roosevelt contra a Standard Oil de John D. Rockefeller, achei exagerado. Afinal, o povo nunca pagara tão pouco pelo petróleo.
Quando Tim Wu publicou seu The Curse of Big Business (Columbia Global Reports, 2018), ainda achei exagerada a apologia feita das ideias de Louis Brandeis, o futuro Juiz da Suprema Corte americana, indicado e m 1916, pelo Presidente Woodrow Wilson. Afinal, qual o problema de uma pessoa de mérito ser extremamente rica?
Na verdade, Theodore Roosevelt tinha razão em investir contra a Standard Oil, apesar dos preços baixíssimos de seus produtos. O preço baixo não pode anestesiar. E Tim Wu tinha razão em recordar, em seu livro, o pensamento de Brandeis, tão atual. E Brandeis tinha razão em sua preocupação com o poder da riqueza exagerada. Às vezes, a pura teoria traz benefícios materiais ao homem, ao consumidor, mas, se é possivelmente grande o risco de destruir sua dignidade, morre o mérito da teoria. Nem só de preço baixo vive o homem, nem de serviços aparentemente gratuitos.
Brandeis: Por isso, ainda na Era Pré-Analógica, Brandeis disse uma verdade cada vez mais evidente nos dias da Era Digital: “Podemos ter democracia, ou podemos ter riqueza concentrada nas mãos de poucos, mas não podemos ter os dois”. Sim, por isso a democracia está tão ferida hoje em dia. A riqueza excessiva mente concentrada corrompe. O poder já não emana de eleições, dos representantes do povo, mas do poder econômico. O Poder não emana mais de Deus. As chamadas Big Techs se postam acima de Legislativos, Executivos e Judiciários. Como se fossem deuses.
As Big Techs aboliram a Separação dos Poderes de Montesquieu e nos fizeram voltar ao Ancien Régime: as Big Techs fazem as regras, elas aplicam-nas, elas punem: as Big Techs são os Três Poderes juntos.
Vale a pena uma reflexão sobre o poder e seus vácuos. E o cidadão, nisso tudo. E a chamada Inteligência Artificial está só dando seus primeiros – e rápidos – passos.