Notas & Comentários – 31-05-24

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Os Austríacos: Diferentemente da Física e da Química, quando discutimos áreas humanísticas, econômicas e filosóficas, há sempre reparos éticos e morais a ressalvar: não entramos nisso aqui. Aqui, queremos apenas mencionar quão impressionante foi a contribuição intelectual da Áustria e Império Austro-húngaro naqueles primeiros anos do séc. XX e depois. São incontornáveis nomes como: Wolfgang Pauli (o do Princípio da Exclusão, e Prêmio Nobel), Erwin Schrödinger (o da Equação de Onda e Prêmio Nobel), Ludwig Boltzmann (o da constante), Christian Andreas Doppler (o do Efeito), Nikola Tesla (o da Corrente Alternada), Gregor Mendel (o da Genética), Ferdinand Porsche (o do carro, inclusive do Volkswagen), e muitos psicanalistas, filósofos e economistas como Sigmund Freud (o da Psicanálise), Alfred Adler (o do Complexo de Inferioridade), Ludwig Wittgenstein, Karl Popper, Paul Feyerabend, Joseph Schumpeter, Ludwig von Mises, Friedrich Hayek (“Nobel” de Economia), para citar apenas alguns…

 

Erwin Schrödinger (Viena, 1887 – 1961): Filho de pai católico e mãe luterana, Schrödinger era ateu. Em 1927, teve a honra de suceder a Max Planck na Sociedade Friedrich Wilhelm, em Berlim. Em 1933 Schrödinger havia decidido deixar a Alemanha porque desaprovava veementemente o antissemitismo nazista. Impressionante essa premonição, pois o discurso de ódio nazista ainda não se tornara ação claramente. Schrödinger tentou a Inglaterra. para Oxford. Em 1933, logo após sua chegada a Oxford, recebeu o Prêmio Nobel de Física (com Paul Dirac) pela eminente contribuição à Mecânica Quântica. Em 1966, foi para a Universidade de Graz, na Áustria.

Em 1938, após o Anschluss (anexação da Áustria pelos nazistas), Schrödinger teve problemas em Graz por causa de sua fuga anterior da Alemanha em 1933 e de sua conhecida oposição ao nazismo. Eis que ele emitiu uma declaração retratando-se desta oposição, para manter o emprego. Mais tarde, arrependeu-se de e explicou o motivo a Einstein: “Eu queria permanecer livre – e não poderia fazê-lo sem grande duplicidade”. No entanto, esse gesto de fraqueza não bastou, e a Universidade o demitiu por falta de confiabilidade política. Fugiu e foi parar Dublin, Irlanda, onde viveu modestamente e se tornou Diretor da Escola de Física Teórica em 1940 e lá permaneceu por 17 anos. Naturalizou-se cidadão irlandês em 1948.

 

Schrödinger e as mulheres (i): Erwin teve muito problema com mulheres, inclusive adolescentes. Walter Moore, em A Life of Erwin Schrödinger, Cambridge University Press, 1998, menciona muitos casos inclusive de, literalmente, pedofilia, o que teria levado a família do físico a cortar relações com o biógrafo.

Schrödinger não conseguiu ficar em Oxford ou Princeton justamente porque tinha, digamos, duas mulheres.

Sim, em Oxford seus arranjos domésticos não convencionais, compartilhando alojamento com duas mulheres, não foram aceitos. O mesmo ocorreu em Princeton, onde lecionou em 1934; fora-lhe oferecido um cargo permanente lá, mas também não deu certo. Não era aceitável que morasse ao mesmo tempo com esposa e amante. A grandeza científica não apaga a pequenez do homem.

 

Schrödinger e as mulheres (ii): Desde a história de Abelardo e Heloisa, a lição: não é prudente deixar o tutor e a aluna muito a sós nas aulas (Régine Pernoud. Héloïse et Abélard. Albin Michel, 1970). Schrödinger foi tutor de uma menina de 14 anos chamada “Ithi” Junger (ele tinha 39 anos). Walter Moore relata que as aulas “incluíam ‘uma boa quantidade de carícias e abraços'” e Schrödinger “se apaixonou por sua aluna”. Em 1932 ela, então com 20 anos, engravidou. “Erwin tentou persuadi-la a ter o filho; disse que cuidaria dele, mas não prometeu divorciar-se de sua esposa. Ithi fez o aborto.” A tragédia secular da paixão indevida. Schrödinger dominava a Mecânica Quântica, mas não seu próprio corpo.

No Departamento de Física do Trinity College, Dublin, havia, desde os anos 1990, um Auditório com o nome de Schrödinger. O Departamento recomendou em janeiro de 2022 que o nome fosse retirado, assim como uma foto do cientista, à luz de seu histórico de abuso sexual.

 

“O Gato de Schrödinger”: Os mistérios da Física Quântica impressionaram profundamente Schrödinger, em especial a dualidade da matéria, ao mesmo tempo corpuscular e ondulatória. Por isso ele desenvolveu uma famosa experiência mental chamada o “Gato de Schrödinger” (https://www.youtube.com/watch?v=UjaAxUO6-Uw) . Tal mistério o levou a deixar a Física Quântica um pouco de lado e enveredar pela Biologia, como se esta fosse menos misteriosa…

O homem tem essa mania de querer entender todo mistério da natureza. Mas existem mistérios e Mistérios. E vale lembrar a reflexão de G. K. Chesterton: “Os Mistérios de Deus são mais satisfatórios do que as certezas do homem”.

 

A morte de Schrödinger: Em 4 de janeiro de 1961, Schrödinger morreu de tuberculose, aos 73 anos, em Viena. Schrödinger sofria de tuberculose há muito tempo e, já na década de 1920, ficou internado diversas vezes em um sanatório na Suíça. Aliás, foi lá, no sanatório, que ele formulou sua celebérrima Equação de Onda.

Ele e, depois, a esposa Anny foram enterrados em Alpbach, na Áustria, em um cemitério católico. Embora ele não fosse católico, o padre encarregado do cemitério permitiu o enterro porque Schrödinger era membro da Pontifícia Academia de Ciências. Sobrepujando o túmulo do casal, a Equação de Onda de Schrödinger. E sob os nomes do casal, a abreviação da expressão latina Requiescat in Pace – RIP: Descanse em paz.