Notas & Comentários – 09-02-2024

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A Morte de De Gaulle: Em 9.11.1970, o General Charles De Gaulle pega as cartas de seu baralho e dá início, como de costume, a uma partida de paciência na biblioteca de sua casa, La Boisserie, em Colombey-les-Deux-Églises. Queixou-se de uma dor nas costas, antes de sucumbir, às 19:02h, vítima de um aneurisma de aorta abdominal. Em 20 minutos estava morto, antes mesmo que chegasse m o médico e padre: um para tratar da saúde do corpo, o outro para cuidar da saúde da alma.

O anúncio da morte de De Gaulle, pelo seu sucessor, Georges Pompidou, foi digno: “A França está viúva”. Não era exagero. Poderia também dizer que a França estava órfã.

A Homenagem: O funeral de De Gaulle ocorreu em 12.11.1970 em Colombey-les-Deux-Églises, na presença de 50.000 pessoas e uma delegação das Forças Armadas francesas, única participação oficial autorizada pelo General em seu testamento. A oração fúnebre foi proferida pelo padre Maurice Cordier, combatente da Resistência.

Em Paris, muitos Chefes de Estado estrangeiros reuniram -se para homenagear a memória do General em Notre-Dame; fora, no adro da Catedral, havia 70 mil pessoas acompanhando a cerimônia.

O soldado: De Gaulle e seus 3 irmãos foram mobilizados na Grande Guerra. Imagine -se a angústia da mãe dos meninos (para a mãe, os filhos são sempre “os meninos”)… Mas, graças a Deus, todos emergiram vivos. Charles de Gaulle foi ferido várias vezes e feito prisioneiro pelos alemães, passando por uns dez campos de prisioneiros. Tentou fugir 5 vezes, sem sucesso. Ficou preso durante 32 meses, liberado apenas após o Armistício, em 1918.

De Gaulle era não apenas cabeçudo, mas bravo. Recebeu a Cruz de Cavaleiro da Legião de Honra em 1919, e a Cruz de Guerra 1914-1918 com a estrela de prata. Entendeu o valor dos tanques-de-guerra, mas só reconheceu o poder da aviação tardiamente.

Na Débacle de 1940, De Gaulle foge para a Inglaterra, é acusado de traição, ‘pondo em perigo a segurança do Estado, e de deserção’, sendo condenado (em 2.8.1940) à “pena de morte, degradação militar e confisco de bens móveis e imóveis.” Perde também a nacionalidade em dezembro de 1940… A vida de De Gaulle não foi simples…

A postura: De Gaulle era candidato à reeleição (1965) e foi para o segundo turno, contra o socialista François Mitterrand. Um ministro do General lhe propôs mandar aos jornais fotos comprometedoras de Mitterrand ao lado de Philippe Pétain, o chefe do Governo francês após a rendição do país à Alemanha. O Marechal Pétain foi um herói da Primeira Guerra Mundial, mas seu Governo (Vichy) colaborou com o regime nazista e, pois, aparecer ao lado dele em fotos daquela época causaria um dano enorme a Miterrand. Bem, De Gaulle recusou a manobra, mesmo com Mitterrand o acusando de “golpe de estado permanente”… E venceu a eleição, sem esse tipo de expediente. Outros tempos: mais decência na política.

Membro do Comissariado Geral, no Governo de Vichy, para tratar do repatriamento dos prisioneiros de guerra, François Mitterrand é recebido em audiência pelo Marechal Pétain (15.10.1942).

Bem, a França tinha de cuidar dos seus problemas, apesar da derrota. E De Gaulle fugira para resistir em Londres, a fim de organizar a France Libre no exílio.

O Estadista: De Gaulle estruturou a nova França após a 2ª Guerra Mundial. F oi famoso também como escritor, ainda que não tenha entrado na Académie. Nas suas Mémoires de Guerre (Plon, Paris 1954-1959), ele afirma ter “uma certa ideia da França”, considerando que “a França não pode ser a França sem a Grandeza”. Certo, porém, infelizmente, a Grandeur da França é coisa do passado: morreu com De Gaulle.

Colombey – a filha: Em 1934 o tenente-coronel Charles de Gaulle e sua esposa Yvonne conseguiram adquirir a propriedade de La Boisserie, na cidadezinha de Colombey-les-Deux-Églises.

A filha mais nova, Anne, tinha síndrome de Down (ao lado, com o pai). O casal queria que desfrutasse da vida ao ar livre da zona rural de La Boisserie, ao abrigo da indiscrição pública. Anne de Gaulle gostava muito de suas estadias na Boisserie, até sua morte em fevereiro de 1948.

Quando Anne morreu, De Gaulle, emocionado, disse: “agora você será como os outros”: os anjos. No atentado que sofreu em 1962, ele disse que a bala não penetrou seu corpo por causa da moldura de um retrato de Anne, que sempre levava consigo. Charles e Yvonne de Gaulle estão sepultados ao lado da filha Anne, em Colombey.

Anne amoleceu o coração do General. Ele cantava para e la e lhe contava histórias .

Colombey-les-Deux-Églises, sendo pequenininha (menos de 800 habitantes), se tornou notavelmente grande por causa de De Gaule, o maior personagem da França no séc. XX. Aliás, foi em La Boisserie, sua casa particular, que De Gaulle recebeu Konrad Adenauer pela primeira vez, e os dois líderes católicos abriram o caminho para uma paz duradoura na Europa.

Colombey – o nome: Sempre achei curioso – e belo – o nome Colombey-les-Deux-Églises. Na verdade, havia muitas cidades com o nome Colombey, que vem do latim Columbarium (que quer dizer – pombal): os pombos serviam na Idade Média para levar mensagens (pombo-correio) e… como alimento. Assim, dizer que essa Colombey tinha duas igrejas a distinguia das outras.

Durante a Revolução Francesa, a cidade recebeu o nome de Colombey-la-Montagne, pois, inimiga de Deus, a Revolução trocou todos os topônimos do país que mencionavam qualquer coisa associada à Igreja (e à monarquia). A palavra Montanha remete aos jacobinos, o partido mais radical entre os radicais, que tomavam assento na parte alta (daí, Montanha) da Assembleia Nacional.