Caros,
A primeira catedral de Florença tinha sido a Basilica di San Lorenzo di Firenze, consagrada em 393 pelo grande Santo Ambrósio, substituída pela catedral de Santa Reparata. Essa velha igreja, em estado precário de conservação, tornara-se pequena para a florescente cidade toscana. Era preciso uma nova Catedral.
Em 1294, o Conselho da Cidade de Florença aprova o projeto do arquiteto Arnolfo di Cambio para uma nova Catedral.
A nave da nova catedral estava terminada em 1380, mas quase 40 anos depois, em 1418, a cúpula ainda estava toda por fazer. E não é de estranhar, pois ninguém sabia como construir tão imensa cúpula, a uma altura tão elevada, e que seria a maior do mundo, desde que foi erguido o Panteão na Roma antiga, mil e quatrocentos anos antes.
A cúpula da Catedral de Florença e a Torre Eiffel são dois desafios diferentes, separados por quase cinco séculos.
O desafio da Torre Eiffel não era a torre em si, mas a novidade do material da torre e seu impacto estético: será que fica bem uma torre metálica? Ou seja, parecia possível construir uma torre de ferro daquela altura; a questão era: não será uma coisa monstruosa, disforme, ridícula? Vai agredir as vistas acostumadas a pedra e concreto? A nata da intelectualidade da França achou um absurdo e fez um manifesto para que a Torre não fosse construída.
O desafio da cúpula do Duomo de Florença era de outra natureza: simplesmente, ninguém sabia como construí-la. Não era problema de material, pois conhecia-se o concreto desde os tempos romanos, nem de estética, pois o modelo era encantador, e a maquete mostrava isso.
Gustave Eiffel possuía uma empresa que montava pontes e outras estruturas de aço ou ferro. Filippo Brunelleschi tinha uma ideia, mas nunca edificara nada nem parecido: o desafio era prático, de engenharia, de logística; não havia livro, ou manual, ou tratado mostrando como fazer. Mas Brunelleschi disse: eu faço. E fez.
Começava verdadeiramente o Renascimento.
Grandes Monumentos – Grandes Empreendedores: Vimos, em Notas sobre a Torre Eiffel, que a construção de grandes monumentos inovadores sempre encontra desafios, inclusive técnicos e estéticos. Obstáculos inesperados, questões estruturais, malícia de rivais, inveja humana, incompreensão ignorante, oposição mesmo de intelectuais que se arvoram em árbitros do que é bom e belo. Com a Cúpula da Catedral de Florença, a mais espetacular obra do Renascimento, e que marcou a união da engenharia e da beleza naquele mundo novo, ocorreu algo parecido. A primeira catedral de Florença tinha sido a Basilica di San Lorenzo di Firenze, consagrada em 393 pelo grande Santo Ambrósio, substituída pela catedral de Santa Reparata. Essa velha igreja, em estado precário de conservação, tornara-se pequena para a florescente cidade toscana. Era preciso uma nova Catedral.
A nova Catedral – o desafio da cúpula: Em 1294, o Conselho da Cidade de Florença aprova o projeto do arquiteto Arnolfo di Cambio para uma nova catedral. O autor do projeto já tinha em seu portfólio a construção da igreja de Santa Croce e do Pallazo Vecchio, dois monumentos que ainda hoje engrandecem Florença, e encantam os visitantes. Porém, quando Arnolfo di Cambio morre, em 1302, as obras desaceleram. Os trabalhos são retomados em 1349 e a nave da venerável Santa Reparata é demolida em 1375. A nave da nova catedral estava terminada em 1380, mas quase 40 anos depois, em 1418, a cúpula ainda estava toda por fazer. E não é de estranhar, pois ninguém sabia como construir tão imensa cúpula, a uma altura tão elevada, e que seria a maior do mundo, desde que foi erguido o Panteão na Roma antiga, mil e quatrocentos anos antes.
A Catedral e a Torre (1): São dois desafios diferentes, separados por quase cinco séculos, a cúpula da Catedral de Florença e a Torre Eiffel.
O desafio da Torre Eiffel não era a torre em si, mas a novidade do material da torre e seu impacto estético: será que fica bem uma torre metálica? Será aceitável esteticamente? Ou seja, parecia possível construir uma torre daquela altura, de ferro; a questão era: não será uma coisa monstruosa, disforme, ridícula? Vai agredir as vistas acostumadas a pedra e concreto? A nata da intelectualidade da França achou um absurdo e fez um manifesto para que a Torre não fosse construída. Pessoas do quilate de Guy de Maupassant, o maior contista da França, Alexandre Dumas, fils, o romântico autor de A Dama das Camélias, Leconte de Lisle, o poeta parnasiano, Charles Garnier, o grande arquiteto da Opéra de Paris. Inacreditável.
A Catedral e a Torre (2): Já o desafio da cúpula do Duomo de Florença era de outra natureza: simplesmente, ninguém sabia como construí-la. Não era problema de material, pois conhecia-se o concreto desde os tempos romanos, nem de estética, pois o modelo era encantador, e a maquete mostrava isso. Era o know-how.
Gustave Eiffel possuía uma empresa que montava pontes e outras estruturas de aço e ferro. Filippo Brunelleschi tinha uma ideia, mas nunca edificara nada nem parecido: o desafio era prático, de engenharia; não havia livro, ou tratado mostrando como fazer. Mas Brunelleschi disse: eu faço. E fez.
Brunelleschi fez mais do que certificar o surgimento da Renascença; ele não voltou à antiguidade clássica greco-romana. Brunelleschi foi além dos antigos. Com ele a Renascença superou os clássicos.
O estilo italiano: Havia uma decisão, tomada ainda quando do projeto de Arnolfo de Cambio (1296): não usar aqueles arcobotantes típicos das igrejas góticas do Norte. Os italianos, os florentinos em particular, tinham seu venerável padrão de beleza e não iam ficar copiando modelos medievais do norte europeu. Claro, o gótico era belo, mas a Itália inventou a Renascença.
Assim, no começo do século XV, após cem anos do início de sua construção, a estrutura da Catedral de Florença ainda carecia da cúpula. As características básicas da cúpula tinham de ser aquelas projetadas por Arnolfo di Cambio em 1296; seu modelo de tijolo, com 4,6 m de altura e 9,2 m de comprimento, ficava em um corredor lateral do edifício inacabado e era tido como intocável. Exigia uma cúpula octogonal mais alta e mais larga do que qualquer outra já construída em qualquer tempo ou lugar (mais alta, inclusive, do que o Panteão), sem contrafortes externos para evitar que cedesse à pressão das forças centrífugas, e caísse sob o seu próprio peso.
Em suma, o desafio era enorme. Ninguém sabia como construir uma cúpula assim. Aí Brunelleschi disse: eu sei, eu construo. Foi contratado, e… construiu.
Foi o maior feito de engenharia da história. E o resultado era belo.
A majestosa cúpula da Catedral de Florença foi o grande certificado de nascimento da Renascença: o homem não só igualando mas superando os antigos.
E assim, como na imagem abaixo, II Duomo, a Catedral Santa Maria Del Fiore, subiu, dominando os arredores, atirando-se ao céu.