Notas & Comentários – 11-04-2025

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O Começo da República: A carta a seguir é interessante. Contém um pedido de Silva Jardim a Xavier da Silveira, dois jovens próceres da recém-proclamada República:

O documento apareceu num leilão de Vera Nunes em janeiro de 2020. Trata-se de bilhete manuscrito assinado por Silva Jardim, grande propagandista da República, a Xavier da Silveira, datado de 16.5.1890. Eis o texto:

“Xavier

Natal.

O nosso correligionário Elias Souto deseja ser reintegrado no lugar que ali ocupava na cidade de Macau, como administrador das Rendas Especiais, do qual foi demitido por perseguição monarquica movida pelo Visconde de Ouro Preto, apesar de 4 longos anos de exercício no referido cargo a contento de todos.

Entre as differentes reparações que se têm feito, peço-te com grande empenho, incluir a que se deve ao meu recomendado, que ora a solicita.

Ficarei a dever-te este assignalado serviço.

Saude e Fraternidade

Ass.: Antônio da Silva Jardim.

Macau é uma cidade produtora de sal no Rio Grande do Norte.

(https://www.veranunesleiloes.com.br/peca.asp?ID=6209363&ctd=76&srsltid=AfmBOopbEp4IW GGER4NzC0OIUyrvLmBswKrOvTsUgl_-YgPxV4Ad4lq1)

 

Um novo estilo? Reparam-se alguns aspectos curiosos, se comparados aos dias de hoje:

– O documento foi escrito em papel timbrado com os seguintes dizeres:

Silva Jardim
Conservar Melhorando

Capital Federal

O Rio de Janeiro já não era a Corte, mas a Capital Federal.

– A indicação de familiaridade entre Silva Jardim e Xavier da Silveira, tratado apenas como “Xavier”;

– A palavra “Natal”: Xavier da Silveira estava em Natal, como o governador do estado e, logo, com influência sobre a cidade de Macau;

– Em cima, à direita, a expressão “Um abraço” com uma rubrica, possivelmente do próprio Silva Jardim.

– O pedido de emprego para um correligionário (que teria sido injustamente demitido por perseguição política do Império);

– A forma de cumprimento final “Saude e Fraternidade”, tão no espírito do novo regime.

 

Dois jovens republicanos: Antonio da Silva Jardim e Joaquim Xavier da Silveira Júnior se posicionaram a favor de um regime republicano ainda durante o império. Ambos eram abolicionistas. Jardim um militante radical, fez inúmeras palestras Brasil afora e sofreu mesmo um atentado a bala nessas andanças.

O destino dos dois constitui uma lição do que é política, implicando que mais vale conexões com as elites do que com o povo. Até porque povo não faz revoluções – é sempre a elite que faz – usando o povo, claro. Como dizia Talleyrand:

« Agitar o povo antes de se servir dele, sábia máxima.”

“Agiter le peuple avant de s’en servir, sage maxime.”

Silveira muito mais discreto, ainda que com semelhantes convicções republicanas. Jardim cultivou o povo e, a pretexto de seu radicalismo, o novo governo o ignorou; Silveira era amigo da elite republicana e foi honrado e prestigiado com altas posições governamentais.

 

Silva Jardim – lições da vida: Antonio da Silva Jardim morreu tragado por uma cratera do Monte Vesúvio, aquele famoso vulcão perto de Nápoles.

Silva Jardim é um personagem que impressiona bastante, não pelas ideias, não pelo estilo, mas pelo pendor juvenil para o enfrentamento do perigo. Primeiro, impressiona pela forma como morreu. Depois, pelo que fez e pelo que recebeu como recompensa de seus esforços. Dedicou sua vida à causa da República e dela nada recebeu. Não adentro seu pensamento profundo, mas, de sua morte, tiro acauteladoras lições de vida. Sendo talvez o maior propagandista da República, sequer participou de sua solene Proclamação. Era radical demais… e os republicanos queriam aparentar paz e tranquilidade.