Notas & Comentários – 16-12-2022

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Nova invasão da Bahia: Como CEO, contra quem surgia uma certa má vontade do Conselho de Administração da WIC – Companhia das Índias Ocidentais, Mauricio de Nassau resolveu mostrar serviço e tomar Salvador. Seria a segunda investida holandesa contra a cidade; os holandeses havia tomado Salvador em 1624, sendo expulsos no ano seguinte. A estratégia de Nassau era impedir o desembarque na Bahia de uma enorme frota luso-espanhola que se aprestava a vir expulsar os holandeses do Brasil.

Nassau partiu de Recife em 8 de abril de 1638 com uma frota de 36 embarcações com 3.600 europeus e mil índios (os índios não serviam como escravos, mas serviam para guerrear – nosso aborígene era mais briguento do que trabalhador, na visão nassoviana). No dia 14, estavam diante de Salvador.

O avanço neerlandês foi detido, pelo Conde de Bagnuolo, num lugar famoso da cidade, o Largo de Santo Antônio Além do Carmo.

A lápide ao lado, na fachada da Igreja de São Antônio Além do Carmo, foi afixada 1938.

Nassau pensou em atacar e saquear a cidade, mas foi dissuadido por, digamos, “fiscais” da WIC, que desaconselharam o empreendimento, “por medo de que os soldados pegassem tudo para eles, e ficassem muito ricos e que a Companhia ganhasse o menor quinhão” … Ou seja, uma vitória militar, apenas, não interessava à WIC se não pudesse dispor do objeto da pilhagem.

Ainda assim, a campanha da Bahia deu lucro, apesar do fracasso militar, pelo apresamento de escravos que foram revendidos no Recife… Em outras palavras, roubo de propriedade e pirataria cobriram as despesas da expedição e ainda a deixaram no azul…

Brasil – conquistar e extrair dinheiro: Mas, de onde veio essa ideia de uma empresa privada holandesa querer tomar o Brasil, tornar-nos um asset na sua lista de bens?

A Companhia das Índias Ocidentais – WIC fez um levantamento, buscando responder à pergunta: Onde havia riquezas que ela pudesse tomar, a baixo custo e baixo risco, de modo a trazer valor para seus acionistas? Resposta: no Nordeste do Brasil.

Os Países Baixos estavam em guerra com a Espanha que, na época, dominava Portugal. Os centros de povoamento brasileiros ficavam próximos à praia, logo, ao alcance da formidável marinha holandesa, enquanto nas colônias espanholas ficavam mais no interior, no altiplano. A presa era o Brasil. O custo calculado para tomar o Brasil era de 2,5 milhões de florins (a tonelada de ouro equivalia a 100 mil florins), e a colônia renderia anualmente 8 milhões de florins: havia tanto pau Brasil, tanto açúcar, tanto navio a apresar…

Geopolítica do ataque: ‘Se eu atacar e ocupar o Brasil’, calculou a WIC, ‘a Espanha não reagirá, pois o Brasil é colônia portuguesa, e a prioridade da Espanha não será a defesa do Brasil’. Espanha? Sim, Espanha.

O Rei da Espanha reinava sobre Portugal desde 1580. Quando o Rei Dom Sebastião desapareceu na Batalha de Alcácer-Quibir, sem filhos, foi sucedido por seu tio, o Cardeal Dom Henrique, também sem filhos, por definição, e o trono foi assumido por Felipe II de Espanha, o herdeiro mais próximo na linha de sucessão.

O Brasil poderia, inclusive, servir de base contra a navegação espanhola no Caribe e contra a portuguesa na Carreira da Índia. E no Brasil estavam as terras mais a leste do continente americano, reduzindo o tempo de transporte.

Consultores…: Não havia, claro, essas grandes consultorias internacionais (como as que propuseram a transferência das indústrias ocidentais para a China e outros países nas décadas recentes, para maximização de lucros, ainda que às custas do trabalhador pátrio), mas, havia indivíduos com experiência e visão para aconselhamento…

Jan Andries Moerbeeck produziu um ‘paper’, digo, um folheto, intitulado “Motivos pelos quais a Companhia das Índias Ocidentais deve tirar do Rei de Espanha a terra do Brasil”. O ‘consultor’ asseverava, grandiloquente:

  • Embora a terra do Brasil seja maior que a soma de Alemanha, Inglaterra, Espanha, Irlanda e as 17 províncias dos Países Baixos, só dois lugares importam: Bahia e Pernambuco.
  • As plantações, assim como as mercadorias, não se encontram muito para o interior, porém perto de Salvador e Olinda. Assim elas podem ser atacadas e conquistadas pela Companhia das Índias Ocidentais.
  • dessa terra do Brasil podem ser trazidas para cá, e aqui vendidas ou distribuídas, 60 mil caixas de açúcar.
  • o pau Brasil vale uma tonelada de ouro, livre de despesas.
  • Os dízimos dos bens que o clero possui valem anualmente 3 ou 4 toneladas de ouro.
  • Tudo isso importa em cerca de 77 toneladas de ouro que a WIC poderá tirar anualmente do Brasil.
  • para defender essas terras, as despesas em terra e mar importarão em 27 toneladas de ouro, ou seja, o lucro é de 50 mil toneladas de ouro, obtido com o emprego de um capital menor que essa quantia.

Ou seja: Invadir o Brasil era um empreendimento extraordinário, de baixo risco, de alto retorno. O lucro podia chegar 50.000 toneladas de ouro anualmente.

Retirar o pau Brasil era só derrubar a árvore. O apresamento de navios de comércio ou navios negreiros era fácil. A apropriação indébita do dízimo destinado ao clero católico era imediata. O negócio do açúcar era mais complexo e demandava mais tempo, mas era o mais rendoso: a Europa estava ansiosa por lambuzar-se na doçura do açúcar brasileiro.