Notas & Comentários – 17-02-2023

Clique para continuar a leituraLer novamente a Apresentação desta Nota

Quem era Gutenberg? É impressionante quão pouco se conhece de Johannes Gutenberg. Curiosamente, boa parte do conhecimento advém de disputas judiciais promovidas por ele ou contra ele.

Sabe-se que Johannes Gensfleisch zur Laden zum Gutenberg nasceu em Mogúncia, em torno da virada do século XIV para o XV, e foi lá batizado na igreja de São Cristóvão. Sua cidade natal resolveu arbitrar o ano de 1400, um número redondo, como o de seu nascimento. Assim, pôde comemorar os 500 de Gutenberg com muitos festejos em 1900.

Mas em que dia e mês teria nascido? Nenhum documento conhecido desvenda o mistério. Porém, como naquela época era costume dar à criança o nome do santo do dia do nascimento, deduziu-se que Johannes nasceu no dia 24 de junho, festa de São João Batista.

Foi assim que ficou oficialmente definido que Johannes Gutenberg nasceu em 24 de junho de 1400. A igreja em que foi batizado foi destruída nas devastações da história, e seu túmulo perdido.

O Nome: Foi só em torno de 1427 que o nome zum Gutenberg, surge documentado pela primeira vez. Gutenberg era o nome da casa da família em Mogúncia, e tradicionalmente se acrescentava o nome da casa da família ao próprio nome, mas o pai do inventor preferiu lançar mão do nome de outra propriedade, em Eltville. Assim seu pai se chamava Friele Gensfleisch zur Laden. Só depois apareceu o zum Gutenberg: Johannes Gensfleisch zur Laden zum Gutenberg. Curiosamente, o zum Gutenberg não foi usado antes, ao que parece, porque poderia ser associado às perseguições a judeus na Alemanha, no séc. XIV, na época da Peste Negra, e a família não queria se identificar com esses eventos nem lembrá-los (o nome da casa gutenberg, foi, antes, judenberg, “montanha dos judeus”).

Gutenberg morreu em 1468, sendo sepultado numa igreja da Ordem Terceira de São Francisco.

As línguas, segundo Carlos V: A Alemanha de Gutenberg seguia sendo um agrupamento de cidades ricas, mas um pouco rudes, em muitos aspectos. Excelia em metais, armaduras, ourivesaria, etc., mas mantinha uma certa rudeza primitiva.

É interessante a frase que se atribui a Carlos V, Imperador do Sacro-império Romano-germânico e Rei da Espanha: “Eu falo espanhol com Deus, italiano com as mulheres, francês com os homens e alemão com meu cavalo”. A frase pode ter algum sentido se pensarmos assim, por exemplo: o espanhol lhe pareceria apropriado para as coisas de Deus, com tantos grandes místicos e santos espanhóis no século de Carlos V, e após quase 8 séculos de luta na Reconquista da Espanha e em defesa da Fé; o italiano é uma língua melodiosa e romântica, agradável às mulheres; o francês não é musical nem rude, talvez bom para se dirigir aos homens e, certamente, seria a língua da diplomacia; e o alemão soa mais guturalmente brutal, uma língua capaz de comandar um cavalo no estrépito da batalha.

Na verdade, Carlos V falava muitas línguas, inclusive o flamengo (nasceu em Gante) e o latim, a língua franca da Europa e, claro, da Igreja.

O Papel: Segundo a tradição, o conselheiro imperial Ts’ai Lun (Cai Lun) inventou o papel no ano de 105 a.D.; era feito usando casca de árvore, restos de linho ou cânhamo ou bambu, trapos de roupa, e redes de pescar.

Prisioneiros chineses capturados em Samarkand levaram a arte de fabricar papel para o mundo islâmico, a qual chegou, por essa via, à Espanha. Esse papel era delgado, macio, mole, dobrável, e absorvente, quase como um papel higiênico atual. Só se podia escrever de um lado, pois as marcas apareciam no outro.

Os europeus, para poderem usar o papel com suas penas de escrever, transformaram o papel oriental, endurecendo-o com cola animal, tornando-o firme e sua superfície impermeável: podiam, assim, escrever dos dois lados. Era um caminho para chegar a um papel utilizável para fins de impressão com tipos móveis.

Ideogramas, sílabas, alfabeto: A vantagem do alfabeto é que usa poucos símbolos, entre 25 e 40, para representar todo o espectro de sons de uma língua. E, como a fala, as crianças o aprendem e empregam facilmente. Enquanto a Mesopotâmia desenvolvia e usava seus cuneiformes, o Egito, seus hieroglifos, e os chineses, seus símbolos, conta a tradição que artesãos e mercadores gregos (sim, mercadores, não os escribas) se apossaram do alfabeto fenício e lançaram os fundamentos da alfabetização da Europa.

Mesmo com os símbolos chineses sendo baseados em sílabas (e não em palavras), era muito difícil a imprensa tipográfica se desenvolver na China, pelo enorme número de tipos necessários para montar o livro.

Assim, mesmo contando com muitos elementos que poderiam prenunciá-la, a imprensa com tipos móveis não surgiu e prosperou no oriente.  Por quê?

O que faltou no Oriente: John Man, em seu livro Gutenberg – How One Man Remade the World with Words, propõe uma explicação:

  • O sistema de escrita oriental era muito complexo; a imprensa com tipos móveis requer um alfabeto.
  • Os sistemas de escrita existentes eram conservadores, i.e., as pessoas que o utilizavam eram resistentes a mudanças, tinham interesse em não mudar.
  • O papel chinês era adequado para escrita manual, mas não servia para impressão.
  • Não havia prensa de parafuso no Oriente. Até porque lá não bebiam vinho, nem tinham oliveiras, coisas que demandavam prensa.
  • A imprensa à la Gutenberg era cara, exigia investimento prévio e por longo tempo, antes de começar a dar algum retorno, e Coreia, China e Japão não dispunham de um sistema de financiamento de capital para pesquisa e desenvolvimento.